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Um contador pode ser registrado como mei ou como eireli?
O Código Civil Brasileiro estabelece, no parágrafo único do art. 966 da Lei 10.406/2020
O Código Civil Brasileiro estabelece, no parágrafo único do art. 966 da Lei 10.406/2020, que "não se considera empresário quem exerce profissão intelectual, de natureza científica, literária ou artística, ainda que com o concurso de auxiliares ou colaboradores, salvo se o exercício da profissão constituir elemento de empresa."
Sendo assim, para um contador ou técnico em contabilidade exercer suas atividades, para ser considerado empresário, criando uma Micro Empresa Individual (MEI) ou uma Empresa Individual de Responsabilidade Limitada (EIRELI), é necessário que ela possua "elementos de empresa". Isso elicita a seguinte pergunta: O que significa "elemento de empresa"?
Sobre o conceito de "elemento de empresa", existem três correntes com posições divergentes, a saber: A primeira defende que "elemento de empresa" é quando o profissional possui um número elevado de clientes e passa a se preocupar mais com a gestão do escritório, transferindo a execução das atividades técnicas para os funcionários contadores; a segunda diz que "elemento de empresa" ocorre nas profissões intelectuais cujas atividades não são personalíssimas, não são privativas dos profissionais com diploma acadêmico (no caso das profissões com atividades privativas, quem autoriza o exercício da atividade não é o Registro do Comércio, mas o diploma registrado no conselho de fiscalização profissional); a terceira corrente defende que "elemento de empresa" é quando o profissional, ainda que desenvolva atividade privativa, oferece mais do que o serviço profissional, como, por exemplo, um médico, que disponibiliza, além da consulta médica, serviços de SPA, para os seus pacientes; ou um veterinário, que, além de cuidar da saúde do animal, vende ração e outros produtos; ou um contador, que além de oferecer os serviços de contabilidade, vende material de escritório. Seria o elemento de empresa contido na atividade profissional que o classificaria como empresário. Esse grupo baseia a defesa da sua tese no Enunciado 193 da III Jornada de Direito Civil promovida pelo Conselho Federal de Justiça, que estabelece que "o exercício de atividade de natureza exclusivamente intelectual está excluido do do conceito de empresa".
De acordo com os conceitos acima, para um profissional contábil se tornar MEI somente no caso de exercer atividade mista, como a prestação de serviços contábeis e a venda de mercadorias. Ele não poderia se constituir para desenvolver exclusivamente "serviços contábeis", pois, neste caso, como é um escritório pequeno, podendo ter apenas um funcionário, lhe faltaria a comprovação do elemento de empresa. Assim, o Comitê Gestor do Simples Nacional, através da Resolução 137, de 4/12/2017, excluiu as atividades contábeis das atividades passíveis de enquadramento no MEI.
Já para se constituir como EIRELI, o escritório contábil se enquadraria na primeira corrente, a que defende que elemento de empresa é quando o escritório cresce e o responsável se preocupa em gerir o seu estabelecimento, transferindo a execução das atividades do escritório para os seus funcionários contadores. Como a EIRELI precisa comprovar um capital de 100 salários mínimos para se constituir, se trata de um grande escritório. Neste caso, porém, para que esta constituição não afrontasse o Enunciado 193 do Conselho Federal de Justiça, segundo o qual "o exercício de atividade de natureza exclusivamente intelectual está excluído do conceito de empresa", deveria ser criado também para exercer atividade mista (serviços e comércio). Ainda, um escritório que presta serviços exclusivos de contabilidade não poderia ser constituído como EIRELI, porque se os profissionais contábeis, no exercício de suas atividades, cometerem falhas técnicas, trazendo prejuízos a terceiros, a sua responsabilidade é ilimitada, conforme normas estabelecidas no Código Civil e nos direitos dos consumidores.
Sobre este assunto, o Conselho Federal de Contabilidade se manifestou através da Resolução CFC nº 1.555, de 6/12/2018, dizendo que o profissional contábil pode requerer o seu registro no CRC como MEI e/ou EIRELI, e por qualquer outra forma jurídica, e que a única pessoa impedida de obter o registro neste órgão é a Sociedade Anônima (S/A) (a lei estabelece que a S/A é uma pessoa empresarial, independente da atividade desenvolvida); podendo, inclusive, uma pessoa jurídica ser sócia de outra pessoa jurídica para desenvolver atividades contábeis.
No nosso entender, o Conselho Federal de Contabilidade agiu de forma contrária às normas legais que regulam o exercício das atividades contábeis. Pelas normas legais, as atividades contábeis são atividades personalíssimas, e quem autoriza o contador a exercer as atividades contábeis é o registro do diploma no Conselho de Contabilidade e não no Registro do Comércio, não podendo estas atividades ser consideradas econômicas. Assim, um contador não poderia constituir uma pessoa jurídica individual para exercer as suas atividades profissionais. Esperamos que os conselheiros do Conselho Federal de Contabilidade solicitem a alteração da Resolução 1.555/2018, estabelecendo que os escritórios contábeis não desenvolvem atividade econômica, mas, sim, profissional, servindo para prestar, com exclusividade, os serviços contábeis; e que suas atividades são de natureza intelectual e não estão inseridas no conceito de empresa.
Salézio Dagostim é contador; pesquisador contábil; professor da Escola Brasileira de Contabilidade (EBRACON); autor de livros de contabilidade; fundador e ex-presidente do Sindicato dos Contadores do Estado do Rio Grande do Sul e da APROCON CONTÁBIL-RS; presidente de honra da Confederação dos Profissionais Contábeis do Brasil - APROCON BRASIL, e sócio do escritório contábil estabelecido em Porto Alegre (RS), Dagostim Contadores Associados, à Rua Dr. Barros Cassal, 33, 11º andar. E-mail para contato: salezio@dagostim.com.br